quinta-feira, 10 de fevereiro de 2011

Sim, eu sou um controlador

Marcio Trevisan
Durante a maior parte da minha vida assumi a função de controlar a vida dos outros. É duro demais reconhecer e ainda publicar esta terrível verdade, mas... sou eu que quero brincar disso.

Controladora, mas não deliberada ou maldosamente, é claro. Porque antes de tudo, sou uma pessoa muito legal, muito bacana que se preocupa mais com a felicidade dos outros do que com a  própria. E mais: com a disposição de fazer mais pelo sucesso e bem estar dos que estão a minha volta do que por mim mesma. Sempre fui cristã e, inclusive acreditava que desta maneira conquistaria meu sonhado lugar no céu. Aprendi isso desde pequena.

Minha dedicação, meu tempo, meu amor, meu trabalho, meu dinheiro, meus bens em função dos outros, em primeiro lugar. A tal ponto que sempre tive uma dificuldade,  vergonha mesmo, de usar qualquer tipo de vocábulo que indique posse. No máximo, um "nosso", no lugar de "meu", para não ferir ninguém com meu capitalismo ou minhas realizações.

Você está achando muito cruel este perfil? Então agregue a esta bondade, passível de um processo de canonização, o poder praticamente divino  de entender, perdoar ofensas, promover incondicionalmente a harmonia entre as pessoas, principalmente os familiares, ao meu redor.  Santidade pouca é bobagem!!

Com este estilo de vida, eu sempre estava ocupada - este não é o problema, mas sem nenhum tempo pra mim. O consumo de energia e de tempo para administrar todos os relacionamentos a minha volta e os seus problemas corriqueiros era desumano. O pai (meu ex-marido) não podia brigar com os meus filhos; o filho não devia desrespeitar o irmão, se alterar com o padrasto - nem pensar; o meu marido não podia se desentender com a ex dele; os meus filhos não podiam quebrar o pau com a minha enteada e nem a minha enteada .... No trabalho, em outro âmbito, a mesma coisa, evidentemente.

Eu estava sempre no meio de tudo, como um polvo intermediando com seus tentáculos elásticos todas estas relações. E ainda, os problemas mesmos, as situações concretas, a demandar soluções e encaminhamentos administrativos e burocráticos eram de responsabilidade exclusivamente minha. Claro! A quem mais eu poderia delegar assuntos tão importantes? Quem faria melhor do que eu? Ninguém, é óbvio.  

Para tentar - sabendo que não é possível, me redimir deste terrível perfil, digo que não estou sozinha. Permita-me este testemunho alheio. Recentemente, uma conhecida - tão "bacana" e "nada" controladora, como eu - confessou algo incrível. O  marido ao executar uma tarefa doméstica que ela não consegue fazer (tipo conserto elétrico) deve aguentá-la ordenando qual das mãos ELE deve usar. "Mas eu sei que ele trabalha melhor com a esquerda, porque vai fazer com a direita?" Ufa!! Estou salva!
A coisa chega a este nível!! Mas, só é possível vestir esta máscara de santa, que cuida e é responsável por absolutamente tudo neste mundo de perfeição que temos a missão de criar, porque temos disponível o super, maravilhoso, eficiente e gratuito: piloto automático. Detalhe: este profissional tem apenas uma atribuição: desviar a nossa atenção de nós mesmos e nossos verdadeiros papéis na vida, para que possamos nos gastar na tentativa impossível de controlar a vida dos outros. e, com isso a nossa própria.

Se você já se deu conta que é um controlador, muita calma nessa hora. É difícil assumir isso por mais que há algum tempo o adjetivo esteja sendo jogado na sua cara! Então, se neste momento você está se dizendo "sim, eu sou um controlador", um super parabéns para você.

O próximo passo NÃO é deixar de fazer tudo o que você tem feito até hoje. Calma. Primeiro, cuide apenas do piloto automático - coloque-o no paredão e o fuzile com vontade. Garanto que ele não morrerá nem com uma sessão coletiva de artilharia pesada.

Comece, percebendo quando ele está ligado! Para isso, identifique os seus sentimentos - de forma verdadeira, diante dos pequenos acontecimentos do seu dia.  Preste atenção em você - e não no outro -  antes de responder, se posicionar ou agir. Pergunte-se qual é o seu papel na situação - de mãe, pai,  filho,  chefe, subordinado, amigo... Mais à frente complemente: de que maneira  quero desempenhar este papel?

Com mais tempo, deixe para o outro o que é responsabilidade do outro. Cada um no seu quadrado: porque pai e filho só se conhecerão e terão um relacionamento verdadeiro, se puderem brigar, conviver de verdade, se posicionarem diante de suas diferenças. Não tema, as divergências, principalmente dos outros, em relaçao aos outros. Confie mais no amor que une as pessoas. E aprenda: não há nada a fazer, o controle não é seu, por mais que você queira. O comando é de Deus. Deixa esta tarefinha básica pra Ele.

Cuide para que você cuide só da sua vida - sem controle! Converse mais com Deus. Aos poucos, o piloto automático vai perder o emprego.

Agora, se você ainda não teve coragem de assumir a sua condição de controlador, fique com esta dica: o controlador é sempre controlado por alguém ou alguma coisa. Pense nisso, funciona.

Um comentário:

  1. ADOREI!!!
    Só o fato de ver, assumir e aceitar que é, já é um grande avanço interior.
    Não se preocupe em entender, porque
    VIVER..... ultrapassa qualquer entendimento!!!

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