quarta-feira, 20 de julho de 2011

"Vocë é adiantado no atraso?"

Aos 28 anos, primeiro divórcio. Tive um problema de saúde e minha médica sugeriu-me um tratamento homeopático. Já sabia que isso não combinava comigo. Bolinhas ou gotinhas regiamente contadas para serem consumidas em períodos impróprios, como por exemplo, de quinze em quinze minutos. Nunca questionei o resultado, mas era fato que jamais poderia me adaptar a condições como esta para fazer qualquer coisa.
Foto: Talles Andrioli

Contudo, escolhi um especialista e parti para uma rodada de consultas e experiências com os tais glóbulos. Este homeopata foi a primeira pessoa a me questionar a respeito de ansiedade. Perguntou-me: “Você é ansiosa?” Ao que respondi de estalo: “Claro que não, só não suporto a morosidade dos outros.” A conversa não prosseguiu, nem o tratamento – porque o médico disse que não conseguia me diagnosticar. Pasme: ele acreditou na minha resposta.

E por mais 20 anos, não pensei nisso.

A resposta dada ao médico não denunciava apenas a ansiedade. Ia junto, uma dose de arrogância, prepotência, autoritarismo. E não denunciava outro componente importante dos meus atributos, o perfeccionismo. Mas o pior de tudo, era que eu gostava de ser assim. O pique, o dinamismo, a disposição infinita, a energia eram marcas conseqüentes que encobriam a verdade – a ansiedade. As pessoas elogiavam, mesmo as mais próximas, que não podiam (-Claro! Quem iria querer?)  me acompanhar.

Duas décadas neste padrão deram-me, além de dois divórcios, abortos de várias outras iniciativas mais significativas para a minha vida. Mas, sem dúvidas, a pior conseqüência dizia respeito a duas situações: a minha saúde e a qualidade dos meus relacionamentos mais importantes - com os filhos no topo da lista.

Como demorei a me diagnosticar como uma ansiosa, de carteirinha! Difícil, porque eu também sou uma pessoa muito paciente – não sei como descrever o funcionamento de duas características tão antagônicas em uma mesma pessoa, confesso. Parece que tudo funciona para encobrir o que deve ser corrigido.

E olha, que desde muito jovem, meu avô Tunico perguntava-me, quando me percebia na correria: “Você está adiantada no atraso?” Eu só achava graça, mas quanta sabedoria!

O real diagnóstico veio depois das primeiras férias de trinta dias em quinze anos de trabalho.  Tive a oportunidade de fazer uma viagem e ficar todo o tempo fora de contato, sem nenhuma preocupação e pouquíssimas informações a respeito do meu mundo. Não fiz nenhum compromisso, nem mesmo o de descansar ou me divertir. Fui, simplesmente. Mas para permanecer em cada local visitado, de corpo, alma e espírito, foi preciso muito empenho e orações.  Consegui, afinal, e voltei.

Duas semanas depois e eu precisava “resolver a minha vida”. Estava para dar cabo de um projeto que consumiu esforço da minha família e de muitas outras pessoas nos últimos dez anos.  Não era possível estar tão cansada, esgotada, sem forças, sem visão. Sim, eu poderia acabar com tudo e começar outra coisa nova. E como é bom o começo, com suas novidades animadoras e renovadoras.

Uma conversa com um amigo, que é contador, colocou-me diante do fato que, desta vez, enxerguei de forma transparente. Era mais fácil, pra mim, simplesmente abrir mão de tudo e reiniciar do zero do que me perguntar o que poderia fazer para eu ser nova, para identificar os limites que impediam meu crescimento e realmente ultrapassá-los.

Conforme meu entendimento sobre a ansiedade se ampliava, sentia vergonha de demorar tanto para percebê-la. E meu primeiro exercício foi não ficar ansiosa para acabar com a ansiedade.

A voz de Deus em mim passou a me dizer (agora eu a ouvia) a todo instante: “Espera!” É difícil mudar o padrão de uma vida inteira. Confio e troco a ansiedade pela serenidade. É uma troca incrível! Com ela, consigo permanecer no presente – em tempo, espaço, pessoas e eu mesmo. É claro que ainda tenho que me segurar para não disparar para o futuro ou o passado e manter a minha atenção, em verdade, no aqui e agora.

Encaro as alegrias, os dissabores, o que pintar; me posiciono, sem me preocupar em ser perfeita. Tenho um Deus perfeito e a consciência de que nunca atingirei a perfeição - ainda bem!

Como bem tentou ensinar o Tunico, aquele que quer se adiantar está fadado ao atraso. O presente é o tempo da vida, o único que pode ser afetado, impactado e modificado pela minha presença. Se eu estiver presente. Tunicoterapia, valeu!



4 comentários:

  1. Esse post veio em boa hora. Ainda bem que ele estará sempre aqui quando eu precisar relembrar o que é preciso na luta contra a ansiedade! Amei!

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  2. Ai que saudades do vô Tunico! Quanta verdade! Reflexão providencial para uma gestante na décima terceira semana e que tem que esperar até a quadragésima para conhecer o rostinho do seu bebê.
    Bjs, Cró.

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  3. Regina, você parece ser bastante consciente enquanto pessoa - o que a coloca aparentemente dentre aqueles que não só batalham na vida, como planejam a vida.

    É difícil não sentir ansiedade no mundo atual onde temos tanta pressão no nosso dia a dia, ainda mais, sendo mulher - e por períodos, divorciada e com filhos - que costuma abarcar uma quota mais do que a justa.

    Afora o que você mesma já apontou com categoria, dentro do estudo do MBTI dos Tipos de Personalidade (16 diferentes tipos), alguns tipos são mais propensos a ansiedade, porque são naturalmente voltados para o futuro, ate mesmo porque são intuitivos e os veem claramente.

    Muitas vezes eh difícil transmitir esta visão e o porquê das coisas, para pessoas que não são intuitivas e ainda por cima precisam de fatos concretos para entender o que o intuitivo esta dizendo ou coordenando. Isso tudo gera ansiedade também.
    Porem, a teoria de Jung explica tão claramente, porque temos a necessidade de descobrirmos novo jeito de ser na segunda metade da vida (apos nossos 35 anos de idade).

    Nossa personalidade, aquela outra que viveu na sombra daquela que foi nossa personalidade consciente pede um lugar ao sol.
    E essa uma, aquela que ficou abafadinha ali dentro, foi a maior responsável por dar seus cutucões ali de dentro, e mais, criando essa ansiedade, só de castigo, aguardando o dia em que o ser pudesse ser mais integrado e a absorvesse também para atuar no mundo consciente.
    Rosely Covali

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  4. Olá Regina.
    Realmente é fato, podermos ter estas características antagônicas, ser perfeccionista e não viver no presente. Eu sou assim!
    Falo isto me baseando em meus pensamentos, textos, reflexões e tudo, nunca é pra hoje.
    Prefiro desmontar todo quebra-cabeça e montá-lo do que ir por partes e ir tentando, aos poucos, com tempo e calma, organizá-lo.
    E quem diria, ontem ainda escrevi um texto sobre perfeição.
    Como nos mostra em Mateus 6:34 - Portanto, não vos inquieteis com o dia de amanhã, pois o amanhã trará os seus cuidados; basta ao dia o seu próprio mal.
    Ainda estou trabalhando em cima deste versículo. Depois de orações e "quebra-caras" a ansiedade não precisa me acompanhar. ;)
    Bela reflexão!

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